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Biografia de
Corbiniano Alves de Souza Freire
Corbiniano Alves de Souza Freire, nasceu em 23 de outubro 1910, casou aproximadamente em 1936, com com sua prima Aurea Alves Brandão que nasceu por volta de 1916, e faleceu por volta de 1980 em Itabuna no estado da Bahia. Corbiniano era filho de José Zacarias de Souza Freire, que nasceu aproximadamente em 1877 em Sergipe, e faleceu aproximadamente em 1942 na cidade de Itabuna no estado da Bahia, era farmacêutico diplomado pela Faculdade de Medicina da Bahia e pertencendo a uma das mais tradicionais famílias do estado de Sergipe. Casou-se aprox. por volta de 1907 com Blandina Alves que nasceu por volta de 1887 e faleceu aproximadamente em 1957, em Itabuna no estado da Bahia, segunda filha do Comendador José Firmino Alves, que nasceu por volta de 1875 em Sergipe e faleceu por volta de 1945 em Itabuna no estado da Bahia - o fundador da cidade de Itabuna.
Corbiniano e Áurea tiveram os seguintes filhos:
1- Raimundo
Brandão Freire, que nasceu por volta de 1938 2- Luiz Brandão Freire, que nasceu por volta de 1939 |
LIGEIRO PERFIL DE CORBINIANO FREIRE
por
José Alves de Souza Freire
Foi Corbiniano Freire uma dessas pessoas que, tendo amadurecido muito
cedo, praticamente não teve infância. Adolescente, ainda, preocupava-se em
ajudar os pais, ora na farmácia, ora na fazenda de cacau, ora em singelos trabalhos do ambiente doméstico, que não lhe deixavam tempo para os naturais
folguedos tão próprios dos jovens de sua idade. Em tudo que fazia colocava
um tal acento de austeridade, sisudez e dedicação que, aos olhos de muitos,
se afigurava um menino precoce, desenvolvido, um perfeito homenzinho, como então
se dizia, cativando assim, a estima e a admiração de quantos o conheciam.
Era, pois, a aplicação personificada, inclusive nos estudos a que se
dedicava com verdadeiro afinco, inteligência e grande senso de
responsabilidade, que se mostravam admiravelmente aliados a uma visão prática
e objetiva de vida.
Nascido a 23 de outubro de 1910, fora o terceiro filho do casal José Zacarias
de Souza Freire - farmacêutico diplomado pela Faculdade de Medicina da Bahia
e pertencendo a uma das mais tradicionais famílias do estado de Sergipe, e
Blandina Alves Freire, segunda filha do Comendador José Firmino Alves - o
fundador de Itabuna. Cursou as primeiras letras nesta cidade, nas escolas de
D. Maria José Borba, Alzira Paim e do Prof. Américo Costa.
Em Salvador, foi aluno aplicado do Colégio Antonio Vieira onde concluiu o
curso ginasial e, logo depois, ingressou na Faculdade de Medicina,
diplomando-se, após curso distinto, em 1936.
Casando-se, logo em seguida à formatura, com sua prima Áurea Alves Brandão
(filha), fixou-se em Itabuna, sua terra natal, onde instalou consultório médico.
Juntando-se a um grupo de abnegados e brilhantes colegas como Vitor Maron,
Orlando Galvão e outros, tendo à frente o Prof. Alício Peltier de Queiroz,
mestre de todos na cirurgia geral e ginecológica, não tardou Corbiniano se
destacar como dos mais hábeis cirurgiões e dos mais conceituados clínicos
da região.
Da atividade desse homogêneo grupo de abnegados médicos surgiu, como fruto
dos mais preciosos, a "Sociedade de Cirurgia e Medicina de Itabuna",
que, durante largos anos de pleno funcionamento, fez desta Cidade um famoso
centro de cirurgia regional, transpondo inclusive as fronteiras do Estado e até
do País, conforme se constatava pelo constante intercâmbio de correspondências
com outros centros similares, como os de Buenos Aires e Montevidéu, para não
falar ainda de sociedades norte americanas que, com freqüência através dos
consulados do Rio de Janeiro e de Salvador, remessas de trabalhos e,
sobretudo, dos famosos "Anais" da mencionada Sociedade.
Com Vitor Maron, um dos seus mais fiéis e brilhantes colaboradores, foi
responsável pela remodelação e reaparelhamento integrais do velho hospital
"Santa Cruz" da Santa Casa de Misericórdia de Itabuna, para a qual,
graças à sua influência com representantes de certa área política,
conseguiu inúmeras e substanciais dotações à manutenção dos seus serviços
hospitalares.
Valendo-se, ainda, dos bons ofícios do seu dileto e reconhecido amigo
deputado federal Manoel Novais - a quem, vítima de insidiosa
"tocaia", nos idos de 1945, salvou, à luz incerta de um pequeno
motor de emergência, a preciosa vida, que inúmeros caroços de chumbo grosso
tentara ceifar - decisiva foi sua contribuição pessoal para dotar Itabuna de
uma das mais modernas unidades hospitalares do Estado. Surgiu assim o hospital
"Manoel Novais" que, junto com o hospital "Santa Cruz" e
por força de convênio do Estado com a "Santa Casa de Misericórdia de
Itabuna", passou Corbiniano a dirigir, como diretor médico, durante
muitos anos, com invulgar e modelar competência técnica, até ao ponto da
estafa, quando, então, por conselho médico e para submeter-se a longo
tratamento, teve de afastar-se das suas atividades profissionais, perdendo
assim o povo da região cacaueira, principalmente o da classe mais humilde,
uma perene fonte de assistência aos seus males físicos e até materiais.
Desse modo, Corbiniano Freire, que ainda foi responsável pela localização,
construção e instalação do eficiente Posto de Puericultura "Isolina
Guimarães", a que o Dr. Reis Lessa, como pediatra deu impulso decisivo,
pôde granjear estima, respeito, consideração, não só como profissional
que o era sem dúvida dos mais competentes e conscienciosos, mas também como
cidadão, ambos absolutamente integrados nos problemas mais urgentes da sua
terra e do seu, aos quais tanto amara, e em cujos destinos pensara
intensamente até o momento final da sua morte.
A homenagem póstuma que a "Santa Casa de Misericórdia de Itabuna",
por sua atual provedoria e sob os auspícios da CEPLAC, do ICB e de tantos
outros órgãos locais, incluindo a espontânea colaboração do povo
itabunense, pretende prestar-lhe fazendo construir uma modelar maternidade que
tomará o nome de Corbiniano Freire, é sem dúvida das mais justas e necessárias,
como prova eloqüente de reconhecimento ao mérito de quem, no setor da sua
atividade profissional, foi também responsável pelo surgimento de inúmeras
vidas "Grapiúnas" que hoje povoam as verdes plagas da região
cacaueira.
José Alves de Souza Freire (Retirado do livro UM MÉDICO - UMA ÉPOCA. Testemunho de uma geração. 1972)
Corbiniano
Freire
Alício
Peltier de Queiroz
Nos longes de 1931, na sala improvisada da Rua do Quartel Velho 50, um
adolescente curioso costumava "peruar" as nossas aventurosas
intervenções cirúrgicas.
Era o estudante de medicina Corbiniano Freire. Vem daí o nosso
conhecimento e a amizade que se perlongou pela vida toda.
A Itabuna de então, a "nossa Itabuna", era um burgo bulhento
e gostoso, fotocópia colorida das tumultuadas cidadezinhas de bang-bang.
Belos
tempos, idos e heróicos: o casario se esparramando pelos beiços do
Cachoeira, as silhuetas dos coronéis e dos chefões, tropas coalhando as
ruas, a chuva molhando - 360 dias a terra abençoada, que, aos quando, o
sangue dos meeiros e contratistas empoçava também.
Belos tempos, que o vento levou, dos homens raçudos e valentes e das
moças bonitas, frutos da terra, tantas e tantas... Foi nesse cenário, belo e
violento, que o Dr. Corbiniano Freire, diplomado em medicina, veio fazer seu
apostolado. Eu disse um dia e repito que, naquele tempo, longas eram as
estradas desta terra e, às vezes, muito curta a piedade dos homens.
Corbiniano veio para ficar.
Delicado e sensitivo, tinha um coração muito grande, do "tamanho
de um bonde".
Na estrutura de sua personalidade, conjugava-se a doçura de Zacarias
Freire e a força telúrica dos Alves. Amava com extremos a terra bravia que
seus avós haviam conquistados e sempre conscientizou que as suas raízes nela
mergulhavam fundo, no mistério impenetrável e inarredável das origens.
Corbiniano era manso e bom, mas era másculo. Era um macho.
Tinha um potencial imenso de força e calor humano, que ele transmutava
em solidariedade e carinho pelos necessitados.
Aonde não podia ir com a ciência
e a arte, ia sempre com o coração.
ALGUMAS
PALAVRAS APENAS
Ottoni
Sílva
"(...) O de que sabemos um pouco é da vida terrena. E o que não
gostamos que aconteça é a falta de memória de Itabuna. Uma cidade sem tradição.
Sem história. Ou melhor, sem lembrança do passado que existe brilhante.
Somos uma cidade invadida por forasteiros, em sua maioria buscando riqueza e
poder. Sempre dispostos a arribar quando o azar nos persegue. Não pergunta
quem construiu tudo isso que aí está. Nem como foi construído. Pouco ou
muito, (como queiram), o que fizemos foi com sacrifício, com abnegação. A nós,
itabunenses, cabe cultuar os grandes nomes de nossa história. A eles,
reclamar, de maneira desairosa, pelo que não temos, sem nos ajudar a novas
conquistas, sem abençoar a mão calosa dos construtores.
Eu estava chorando, e chorando na mais profunda dor de quem perde um
amigo-irmão, quando o radialista me perguntou: "Finalmente, quem é esse
rapaz?"
Feriu-me tão forte como minha dor essa indiferença, essa ignorância.
Para você, meu jovem, para Itabuna alheia e indiferente, a quem não se
ensinou ainda o respeito, o culto, a admiração, o agradecimento a tantos que
cuidaram com amor, carinho, bravura, desta terra, sem pedir recompensas, eu
lhes digo um pouquinho do extraordinário vulto de Corbiniano Alves de Souza
Freire.
Era neto do fundador desta cidade. Pouco importaria, não tivesse o
mesmo glorioso destino de Firmino Alves. Sua grande virtude: amou como ninguém
esta terra esta gente. E porque assim se dedicou, certa vez, entrou em estafa
e quase morria. Aí, Itabuna era mais Itabuna, tinha ainda, integralmente, sua
fisionomia própria. Lideravam-na seus próprios filhos. E o que se viu foi
Itabuna inteira levantar-se em socorro daquela vida preciosíssima. De
Salvador veio uma equipe médica, em avião, a noite, que deveria pousar em
aqui, se houvesse iluminação no campo de pouso. E o milagre aconteceu. O
povo, mas, o povo mesmo, com velas, candeeiros, placas, fifós, tochas,
iluminou toda a pista de nosso campo. E, em volta do Hospital Santa Cruz e em
toda redondeza não havia lugar para mais carros e para a multidão
angustiada, noite adentro, à espera do resultado da cirurgia. Foi a nota mais
emocionante, mais afetiva que se viu nesta terra.
Por que essa devoção? Porque Corbiniano Freire, o Corbi da nossa
intimidade, logo formado veio para Itabuna. Éramos um deserto na medicina,
pontilhado por verdadeiro heróis. Possuíamos um pequeno inóspito nosocômio,
o Santa Cruz. Não havia instrumentos, nem condições para o exercício da
medicina. Mas, o jovem médico, aliado a Vitor Maron, a Orlando Galvão, a
outros inumeráveis, enfrentou a situação. Sem instrumentos, trabalhou com o
cérebro, com as mãos, e, sobretudo, com o coração.
Ginecologista,
mas fazia medicina geral. Da criança ao vovô. era o anestesista das grandes
operações em que ele próprio era o cirurgião-chefe.
Foram
milhares de crianças trazidas ao mundo por sua mão obstetra. Dia e noite
trabalhando, sem saber a bolsa do paciente. Prova disso é que, homem sóbrio,
não deixou fortuna, mesmo tendo recebido herança. Se era grande médico, sua
pessoa era maior, na humanidade do seu trabalho, na afabilidade com que a
todos tratava. Foi entre os humildes que ele grangeou todo o amor do nosso
povo. A tantos milhares atendeu nas horas de agonia, nos momentos difíceis,
somente quando o indivíduo sabe que a saúde é o maior bem, a maior riqueza
que possuímos.
(...) Falamos um pouquinho do médico, que foi grande e humanitário. E
do homem? Não temos espaço para dizer tudo. (...).
CORBINIANO
FREIRE: UM HOMEM FORA DE SÉRIE
José
Nunes de Aquino
A comunidade itabunense, ainda sob forte impacto emocional, não se
recuperou totalmente do trauma que a atingiu, com o desaparecimento de um dos
mais representativos espécimes de sua grei.
O inesperado da notícia enunciada de chofre, colheu a todos nós, seus
amigos, com violência de uma descarga elétrica, que nos paralisasse os
movimentos e a razão.
Não podíamos nem queríamos aceitar a evidência dos fatos, apesar da
seqüência copiosa da confirmação da notícia, que nos deixou siderados em
face da brutal realidade, que feriu fundo o cerne da nossa sociedade.
Ainda não temos perspectiva histórica, para a dimensionar em seus
devidos relevos, a figura impar de Corbiniano Freire, sob o crivo de uma
pesquisa minuciosa, capaz de nos dar a grandeza de sua personalidade.
(...) Visitei com ele, há algum tempo, no
Hospital Regional, uma sala de crianças sub-nutridas, convizinhas da
morte, filhas de pais com alto índice sifilítico e pude verificar,
comovidamente, com que interesse ele lutava pela recuperação destas pobres
crianças, a fim de tirá-las da penumbra da ante sala da morte, para
transformá-las em homens e mulheres eugenicamentes saudáveis e dar ao
Brasil, como contingente do seu esforço, uma infância recuperada moral e
fisicamente, arrancando-a com a sua piedade vigilante, das verticais da
Eternidade!
BREVE
ELEGIA A CORBINIANO
Adélcio Benício dos Santos
A crônica da vida registrou, há dias atrás, no seu diário, um
acontecimento normal e ao mesmo tempo estarrecedor.
Normal porque a todos, é natural a morte de um ser humano.
Estarrecedor porque este ser humano foi, em vida, um exemplo extraordinário
de amor ao próximo, de serviços prestados à comunidade, de lealdade e ética
no exercício de sua sublime profissão, de devotamento, amor, respeito e
carinho à sua família, de espírito público e de civismo.
Seu nome: Corbiniano Freire.
(...) Bem posto, simpático, elegante, circunspecto, Corbiniano era uma
figura heráldica.
Bom estudante, excelente companheiro e amigo, cavalgou célebre
os corcéis da vida acadêmica, alcançando com esmero e méritos, os lauréis
da excelência, simbolizados no diploma de Doutor em Medicina.
(...) os seus atos, na vida, foram sempre inspirados no ideal de
servir.
Serviu como médico que fez da profissão o que, em essência, ela
deveria ser - um sacerdócio -, levando ao seu semelhante, com carinho e a
educação que lhe eram predicados natos, o conforto e o socorro que um médico
competente, honesto, eficiente e humano dispensa a qualquer cliente, sem critérios
discriminatórios ou preocupações com vantagens materiais.
Serviu como um grande cidadão, fazendo-se presente em todos os
movimentos impulsionadores do bem-estar da comunidade, sincera, leal,
eficiente e denodadamente, como é o caso do Hospital Santa Cruz, abrigo
acolhedor e amenizador dos sofrimentos físicos de quase a totalidade da nossa
comunidade, do nosso município e, talvez, de nossa região.
Serviu, como homem público, associando-se aos demais companheiros de
sua geração, em memoráveis lutas cívicas, pelejando com bravura e coragem
cívica pela redemocratização do Brasil, pelo seu desenvolvimento e pela sua
felicidade.
Serviu, como exemplar chefe de família, descendente da emérita e
excelsa figura do inolvidável Comendador Firmino Alves, a quem Itabuna deve
sua fundação, sua instalação, seu início de vida.
Corbiniano Freire deixa uma lacuna impreenchível na história
itabunense, tão impreenchível quanto à de seu avô. Foram ambos pioneiros
pertencentes a duas épocas distintas.
TESTEMUNHO
SOBRE CORBINIANO
Nathan
Coutinho
(...) Havia então em Itabuna uma notável equipe médica, liderada
pelo já então grande e brilhante Alício Peltier de Queiroz, que de lá saiu
para, em memorável concurso, conquistar uma cátedra na Faculdade de Medicina
da Bahia.
A vitória de Alício foi também uma vitória de Itabuna e sobretudo
de seus colegas, Corbi à frente.
Lembro-me de sua satisfação, do seu contentamento. Tenho a impressão
que se fosse ele próprio o vitorioso não seria maior sua euforia.
Corbi era assim. Tinha a capacidade de participar, de viver as alegrias
e os sofrimentos de seus amigos.
(...) -
Muitas vezes em palestra comigo, em frente do Tribunal de Contas, onde freqüentemente
nos encontrávamos nos últimos tempos - revelava a sua sensibilidade ante o
sofrimento da chamada "classe desamparada", a legião dos desgraçados
sem eira nem beira a quem prestava os seus serviços médicos e ainda
fornecia, comprados com dinheiro do seu próprio bolso, os remédios que os
seus "clientes" não tinham condição de adquirir.
SÍNTESE
DE UMA SAUDADE
A. Carlos Souto
Há homens, cuja presença transmite qualidade indicativas de seu caráter.
Corbiniano possuía esse dom. Discreto, como que a sondar as opiniões, não
fugia de expor o seu ponto de vista, sem visos de arrogância, geralmente
sublinhada com profundo bom senso, sua qualidade forte e que o distinguia
sobremodo. Analisava todos os problemas dos nossos dias com pronto
discernimento, pondo em relevo os aspectos práticos, com apreciável justeza,
fruto da observação que fazia dos homens e dos fatos. E, por mais sério que
fosse o assunto, era do seu feitio lançar no tom da palestra uma dose de
chiste, com o fim de alegrar o ambiente e, não raro, produzia riso desatado
dos amigos.
UM
HOMEM, UM MÉDICO
Jonatas Milhomens
Poucas criaturas podem reunir a soma de qualidades
positivas que formam a personalidade daquele homem: probidade, amor ao
trabalho, amor à cultura, solidariedade humana, irrepreensível conduta no
exercício dos encargos sociais e, ao lado de tantas virtudes, pronunciado
gosto pelo anedotário. A circunspecção e a facéia em singular binômio.
Figura austera, por vezes carrancuda, que, todavia ao encontro de um
velho amigo, à narração de um episódio galante, logo se desmanchava em
característico sorriso.
Ele apertava os lábios, como uma criança desconfiada, antes de
disparar o comentário satírico, que muito bem esgrimia.
Austeridade e humor, dignidade e clara visão do ridículo nele se
casavam, ou melhor, brigavam. Felizes os que, beneficiários de sua amizade,
podiam assistira vitória do espírito zombeteiro sobre o êmulo de Caxias.
Perguntei se em verdade nocauteara um insolente na hoje Avenida Cinqüentenário.
Não obtive resposta, mas o discreto sorriso, com o apertar dos lábios,
deixara-me satisfeito, convencido. Dispunha também de rígida e treinada
musculatura o jovem doutor em medicina, inteligente, sério, bem posto,
caprichoso, bom.
Certo cliente inspirou-lhe
muito cuidado. Difícil o diagnóstico, não vinha a desejada melhora. E os
dias se passavam, com eles o quadro sombrio.
Um dia, a queima roupa, disse-lhe Corbiniano:
- Nós aqui somos médicos de Província. Por que não vai procurar
outros recursos na Metrópole?
Sim. Havia prestado solene compromisso. Tinha horror de sacrificar a
vida ou a saúde dos outros ao próprio medo ou a própria vaidade.
Homens assim dotados, poucos há. Médicos que assim procedem honram a classe e dignificam a Humanidade.
CORBI
Wilde Oliveira Lima
Ainda o vejo tal como o vi, por anos seguidos, em Itabuna, nos
encontros diários. Eu, Promotor de Justiça e ele médico consagrado e
querido. Uniu-nos, em forte amizade, um ideal comum: o de servir à terra
itabunense, sua pelo berço e minha por adoção.
Dele eu me socorri vezes sem conta, quando me batiam a porta os
desvalidos da sorte, sem um mínimo de condição para o tratamento de seus
males. Um simples bilhete, a princípio, depois um recado, apenas, tal como
uma senha qualquer que sua estima traduzia, bastava para abrir as portas de
seu consultório, de sua casa, do Hospital que ele dirigia.
Os meus pobres doentes eram sempre parte ponderável de sua clientela
anônima e gratuita, a quem ele dispensava, com doçura de pastor e competência
de zeloso profissional, os cuidados necessários.
Em contrapartida, pouco lhe pude dar ou quase nada lhe dei,
profissionalmente. Vindo ao mundo para servir e não para ser servido.
Corbiniano fazia tudo para não incomodar os amigos. Como que não lhe sobrava
tempo, em meio às tribulações diárias a serviço de uma comunidade
inteira, para dar trabalho aos outros...
(...) Homem de fé, de ardente fé em Deus, a patentear, como
experimentado e confesso pecador, a profundeza de sua permanente misericórdia,
estou certo de que o velho e querido amigo está feliz e a velar por nós,
pois cumpriu aqui na terra, como bem poucos, a sua missão.
Soube
amar os seus semelhantes e utilizar, sem usura, a favor de todos, os dons com
que foi dotado.
Exercitando-se no amor, Corbiniano deu aos homens de seu tempo, um exemplo de rara grandeza.
HONRA
AO MÉRITO AO GRANDE AUSENTE DR. CORBINIANO FREIRE
Delza
O tempo passa de mansinho, deixando uma saudade infinita dos que se
foram... Um mês... dois... três? Não me recordo bem. Mas ontem, ao ver a
atitude pouco delicada de um profissional com uma criança, lembrei-me do
senhor, Dr. Corbiniano: Em nosso primeiro contato profissional, eu estava
convalescendo no Hospital Manoel Novais, quando deu entrada uma criança
atropelada e, ao vê-lo examinar o pequeno acidentado, procurei em seus olhos
a verdade... mas o senhor chorava. Na impossibilidade de dar vida aquele
pequenino ser, o senhor chorava...
Foi assim que pude ler através da sua face, sua alma límpida e
cristalina.
Desde esse dia passei admirá-lo. O médico que se queda diante de uma
criança que sofre só pode ser bom.
Fonte:
Estes textos foram gentilmente enviados por Nedson
Freire Santos - (Estes textos
foram retirados do livro UM MÉDICO - UMA ÉPOCA. Testemunho de uma geração.
1972)